Educação de jovens e adultos no contexto nacional e regional

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Voltando ao Teatro Municipal.  Disse eu, então, aos que participavam da reunião: "Sentem-se; este teatro é de vocês!".  Eles riram muito, porque pensavam que eu estava brincando, o que me deixou envergonhado.  Eu dizia: "O teatro é de vocês, cidadãos e cidadãs, já que é com seus impostos que se constroem esta cidade!".  Eles riam ainda mais; um riso nervoso, meio descrente.

Isso me lembrou outro fato real, ocorrido dois antes, em 1989 o prof. Paulo Freire, na época secretário municipal de Educação de São Paulo organizou, junto com o prof.  Pedro Pontual, um congresso de alfabetizandos.  Era preciso fazer um cartaz para a divulgação e, um dia, o prof.  Paulo Freire, andando pela periferia (visitando diversas salas do MOVA que ele criou), viu em uma das classes, anotada na lousa, a primeira frase que um alfabetizando, de 45 anos, conseguiu escrever na vida: "Nós construímos esta cidade e nela somos envergonhados".  Essa frase, registrada ainda com equívocos de grafia e sintaxe, mas pro­fundamente política, foi usada como lema no cartaz do Congresso!

É real!  Só entre os analfabetos, são 43 milhões de homens e mulheres que constroem este país e nele são envergonhados, não se sentem donos, não se sentem proprietários; aliás têm dificuldade até de serem donos de seus próprios corpos, de suas vidas.

 

Qual foi o sonho do prof.  Paulo Freire?  Que homens e mulheres fossem livres!  Só que neste caso a noção de liberdade é outra.  Tem gente que usa uma frase (expressão do individualismo) que diz que “a minha liberdade acaba quando começa a do outro".  Isto é uma violência!  Não é verdade; liberdade é um conceito coletivo.  A minha liberdade não acaba quando começa a do outro; a minha liberdade acaba quando acaba a do outro.

Se algum ser humano não for livre, nenhum ser humano é livre.  Se alguma mulher não for livre da discriminação, nenhuma será livre da discriminação.  Se alguma criança não for livre da falta de escola, nenhuma será livre da falta de escola.  Se alguma pessoa não for livre do racismo, ninguém é livre do racismo; afinal de contas, ser humano é ser junto.

Deste ponto de vista, o que é que nós todas e todos estamos fazendo aqui?  Estamos aqui para dizer não, não à miséria, não à violência, não à vergonha.  Homens e mulheres que fazem e que constroem, não têm acesso, não podem usufruir. É muito provável que aquele que construa Escola nela não entre. É muito provável que aquele que faz o banco escolar nele não sente.  Costumo dizer que a maior prova de violência neste campo é que quem produziu uma caneta ou lápis - não quem a inventou - não saiba usar.

Continua